10.5.07

Manuel Godoy (1767-1851).

Depois de já ter mencionado por diversas vezes esta personagem, impunha-se agora fazer a biografia de Manuel de Godoy y Álvarez de Faría Rios Zarosa, nascido em Badajoz no seio de uma família da pequena nobreza e de mãe portuguesa.
Sendo o seu pai coronel do exército, a sua educação foi desde cedo orientada para o serviço militar, mas também adquire alguns conhecimentos de matemática, humanidades e filosofia. Em 1784 é admitido na corte por Carlos III, juntando-se ao irmão mais velho, que era membro da Guarda de Corpo. Estuda aí francês com os irmãos Joubert, que sobre ele exercem grande influência.
A 8 de Novembro de 1792, oito anos depois da sua chegada, Godoy é nomeado Primeiro Secretário de Estado ou do Despacho e Primeiro Ministro por Carlos IV que desde 1788, altura em que sucedera a seu pai, lhe tinha concedido inúmeras honrarias, promovendo-o de cadete a ajudante general, brigadeiro, marechal de campo e sargento mor da Guarda de Corpo.
A linha política que seguiu foi sempre a de apoiar o campo que parecia ter a vantagem, assim tanto apoiou a Inglaterra, como de seguida apoiou a França. Ao firmar a paz de Basileia, em 1796, recebe o título de Príncipe da Paz e após a Guerra das Laranjas de 1801, é nomeado generalíssimo, título outorgado pela primeira vez em Espanha.
Não caberiam aqui todos os que recebeu até cair em desgraça, mas impõe-se a pergunta, a que se deveu tão rápida ascensão? Uma parte dos historiadores espanhóis, ligou-a à rainha Maria Luísa, de quem seria supostamente amante, mas outra parte, sem descurar esta possibilidade, atribuiu à Revolução Francesa e às hesitações dos ministros Floridablanca e Aranda, que não souberam impôr uma política de fortalecimento da monarquia face aos novos ideiais revolucionários. Segundo esta perspectiva, Godoy seria um homem livre de influências e leal ao seu rei.
Voltando aos factos, a aliança com França, tal como ficara consagrado no primeiro tratado de San Ildefonso, serviria para salvarguardar os territórios ultramarinos, os interesses da Duquesa de Parma, filha de Maria Luísa e, para acalmar os intentos dos republicanos.
No entanto as intrigas, muitas vezes instigadas pelos próprios franceses que secretamente negociavam a paz com Inglaterra e algumas derrotas levaram à sua saída do governo em 1798. Nem as reformas que apoiou, nem o facto do seu governo integrar personagens ilustres, "grandes" de Espanha, o salvou.
Só em 1801 voltou a integrar um governo, embora deixando o cargo de primeiro secretário para um seu primo, tinha sido negociado um ano antes o terceiro tratado de San Ildefonso com França, ficando consagrado desta vez que a Louisiana ficaria para este país, em troca a Duquesa de Parma receberia o reino da Etrúria e as hostilidades seriam abertas com Portugal.
No rescaldo da Guerra das Laranjas, Godoy conseguiu para Espanha a praça de Olivença e em 1802, com a paz de Amiens, firmada entre Napoleão e o monarca inglês, perdeu a ilha de Trinidad, mas recuperou a ilha de Menorca. Napoleão não deixava de interferir na política interna e em 1805 consegue uma nova aliança, que leva ao desastre de Trafalgar, perdendo Espanha a maioria das sua embarcações de guerra.
Em 1806 Napoleão oferece o reino de Nápoles a José Bonaparte, seu irmão, expulsando do trono Fernando IV, irmão do monarca espanhol, algo que não conseguiria sem desfazer a aliança, não fôra a intervenção de Godoy, que odiava essa personagem e a quem já teria sido prometido uma parte de Portugal caso o país fosse invadido.
Os desmedidos pedidos do imperador dos franceses, em homens, dinheiro e territórios, levaram-no a considerar pouco depois a adesão à quarta coligação, mas a derrota da mesma, levou-o a reconsiderar. No ano seguinte adere ao Bloqueio Continental e a 27 de Outubro por intermédio de D. Eugénio Izquierdo, um seu agente, acorda com Napoleão os termos do Tratado de Fontainebleau.
Quando descobriu as intenções de dominío de toda a península já era tarde demais e mesmo antes da ractificação final do documento, já tropas francesas, com o seu beneplácito, tinham atravessado os Pirinéus. Depois veio a exigência da abertura de um caminho militar, com as principais fortalezas guarnecidas por tropas francesas e a linha de fronteira foi transferida para o rio Ebro.
Começaram a surgir das sombras as vozes de descontentamento em relação à sua política, agrupando-se em volta do herdeiro, D. Fernando, a 19 de Março de 1808 e na sequência dos projectos da familia real que pretendia seguir os passos da sua congénere portuguesa e fugir para as Américas, inicia-se o motim de Aranjuez, em que o palácio do favorito é queimado.
Só a rápida intervenção de um exército francês comandado por Murat o salva, escoltando-o até Bayonne, onde pela primeira vez encontra Napoleão em pessoa e onde assiste à abdicação de Carlos IV e à cedência de D. Fernando dos seus direitos ao trono em favor da família Bonaparte.
Em 1814, finda a guerra, Carlos IV abdicou novamente do trono, desta vez em favor de seu filho que toma o título de Fernando VII e entrega a seu pai 8 milhões de reais para que ele viva em Roma sem mais o incomodar, consegue ainda o exílio de Godoy em Pesaro na Itália.
Godoy acompanhou os seus monarcas até à morte dos mesmos, em 1819, mas foi sempre perseguido por D. Fernando que finalmente acabou por conseguir a renúncia aos títulos que lhe tinham sido outorgados, entre os quais o de Príncipe da Paz. A partir de 1832 instala-se em Paris, vivendo a expensas de uma modesta pensão concedida por Luís Felipe.
Na onda de revivalismo do primeiro império, aproveita para escrever as suas memórias, publicadas em castelhano e em francês. Em 1844 e 1847, dois decretos de Isabel II consagram a devolução de todos os seus títulos, com excepção para os de Príncipe da Paz, Generalísimo e Gran Almirante. Não usufrui deles pois ficam retidos até depois da sua morte.
Aos 80 anos de vida é permitido o seu regresso a Espanha, mas rapidamente decide voltar para Paris onde assiste ainda à revolução de 1848 e à ascensão de Napoleão III. A 4 de Outubro de 1851 morre sem que ninguém quer em Espanha, quer em França faça disso grande notícia e é sepultado em campa modesta no cemitério de Père Lachaise.